Lembram-se daqueles filmes sobre o Egipto ou sobre o império romano, em que nos dão uma amostra próxima da realidade do que era a escravatura no seu estado mais puro, onde os tresloucados imperadores, reis e rainhas ordenaram que fossem edificados gigantescos monumentos em honra de Deuses que nem sequer existiam, e que nunca sujaram suas reais mãos de palha e lama, para fazer os compostos desses monumentos? Que crueldade humana!
Por detrás da escravatura existia a loucura real, onde os reis e imperadores e todos os senhores nobres apenas de títulos herdados, davam-se ao luxo de materializar todos os desejos visionários, independentemente do sofrimento infligido a um povo, raça, tribo e por inteiro. Era o genocídio muscular, em que os nobres idealizam e os pobres materializam.
Pão e água eram os escassos e suficientes alimentos que os escravos tinham à sua disposição a custo elevado, pois não existiam supermercados naqueles tempos, e salário mínimo era tão desconhecido como ironicamente, e felizmente, a escravatura também o é. Assim parece, pois não partilho desta opinião.
Os tempos são outros, verdade seja dita. A evolução que existiu desde esses tempos desequilibrados até aos nossos dias apenas conturbados com as dificuldades que passamos, foi, à vista da gente que trabalha e suja as mãos, calejando-as na sua rotina laboriosa, uma metamorfose completa.
Pois para mim, não é tanto assim.
Sinto-me afortunado por ter o meu trabalho, do qual advém o meu sustento, a realização material, a manutenção da minha saúde e da minha realização interior, de ser útil à sociedade e não um vírus que a infecta. Graças à minha persistência de o poder ter e à sorte conspirada pelo mundo que a todos nos toca, mas que às vezes nos queixamos por sentirmos a falta de ser tocada por ela, consegui chegar até onde estou. Não é um trono, mas dá para me sentir rei no meu pequeno mas grandioso reinado. Não dá para comprar o título de Conde, mas dá para viver à minha maneira peculiar no meu condado. Não dá para adquirir o veículo mais rápido que existe para me deslocar para o meu local onde bulo, mas dá bem para ter acesso ao título que me autoriza deslocar em quase todos os transportes que estão dispostos a nós cidadãos. Queixosos como sempre, havendo mesmo a necessidade de nos queixarmos sobre aquilo que achamos motivo de queixa e lamentação, vai dando para viver realmente, mas a velha história de que “uns têm tanto e os outros têm tão pouco, vai para todo o sempre existir, e debato-me com quem disser o contrário, porque esta injustiça como muitas outras, será imortalizada no mundo por haver o desejo que esta verdade absoluta se dissipe.
O tempo da escravatura não acabou, meus caros cidadãos. Existe a ideia de que somos livres, que não somos escravos de ninguém mas, hierarquicamente, somos escravos, e nascemos no berço da servidão com o único propósito na vida: servir e sobreviver.
Felizardo é aquele que não partilha da mesma opinião que eu, por viver em ilusões e fantasiando nos tempos em que a fantasia mentalmente nos visita É realmente a melhor maneira de sobreviver nesta Roma Moderna, neste novo Egipto, nestes campos que, não sendo de algodão o principal cultivo, somos chicoteados mentalmente, ameaçando-nos persistentemente e por vezes, maquiavelicamente utilizando o engenho e artimanha para nos colocarem no olho da rua. O que advém do “ir para o olho da rua”? Eu acho que nem preciso de mencionar o que nos acontece, mas é fácil escrutinar a imagem de que o nosso pequeno reino se desmorono como um simples castelo de cartas, em que os alicerces são frágeis e cedem à tempestade de ser miserável.
É nosso propósito, e para quem não pretende viver com uma filosofia de “nunca mais chega o fim-de-semana” ou um desesperante “nunca mais chega o final do mês”, para lutar pelos direitos de quem trabalha e tem direito a um pequeno reinado, porque o mundo não de uns, mas sim de todos. Quem nasce tem automaticamente o direito de ter direitos e lutar por eles. Falar é fácil, escrever ainda mais. Fazer é uma distância longo para quem se abriga nesta filosofia de vida. Todos são livres de escolherem uma que lhes proporcione o bem-estar e a felicidade. Dê-mos pelo menos liberdade de escolha. Mas que a escravatura ainda existe, que ainda se ouve o silvar do chicote, e que a luta é árdua e perpétua para que esta desumana vida se dissipe como o nevoeiro matinal, mas que no dia seguinte volta a pairar sobre nós, isso não duvidem vós. Ainda há muito, mas mesmo muito para fazer com que a escravatura acabe....
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