Passei pela porta de madeira e entrei,
Na sala vazia só com paredes,
De um branco, simples e imaculado,
Decoradas só com uma lareira.
Por cima, as velas dormiam,
Mas já era a hora de despertarem uma chama,
Que iluminasse aquele lugar onde o mundo,
Dançava com a chama de tal fogueira.
Nunca tinha sido envolvido pelo calor,
Que da sua boca expelia o fogo reluzente,
E por cima, contentes, tremeluziam,
As velas que ondulavam a amarelada luz.
Enfeitavam as paredes de bruxuleantes,
Sombras que não ninguém importunavam,
Escutavam só as nossas conversas,
Escondidas como presentes para oferecer.
Eram só palavras que para dar eu tinha,
Nada mais trazia; só palavras e o meu ser,
E com o seu ser, ficamos juntos a olhar,
A maravilha de um pacífico fogo.
Açoitando a madeira, ouvia-se seu chicote,
Sulcando as costas da pobre madeira,
Só a água podia ser salvação,
Mas não era uma floresta. Era só uma migalha.
Mas se o branco parecia tão vazio,
Não dei conta, pois enchíamos bem a sala,
Ébrios de sorrisos e tranquila calma,
Que se expandiam pelos corpos nus e frios.
Mas já quentes do calor envolvente,
Entrelacei-me nos seus braços de pele fresca.
Fui bebendo o néctar de Dionísio,
E de tanto amor que era feito num pardieiro,
Fomos devagar colocando a nossa cor.
Deixaram as paredes de ser brancas,
Pois quase os anjos via, que tocavam,
Melodias celestiais em harmonia,
Soando suas trombetas de latão.
Lá fora o mundo estava quieto, adormecido,
Esquecido na imensidão de nosso canto,
Que pequeno, revelou ser para mim grande,
Pois grande era o que tinha no coração.
Brilho nos olhos; tranquila paz,
Partilha de angústias passadas,
Brincadeiras de crianças, que contentes,
Esquecem as mundanas ignomínias.
Gestos carinhosos, cabelos afagados,
Troca de carícias e abraços, embriagados.
O desejo de eterna ser a noite,
Tudo eram as minhas cores preferidas.
A areia foi deslizando pela ampulheta,
Subi degraus e tombei imensas vezes,
Sem promessas fui cumprindo meus deveres,
Fui ganhando força num dia de cada vez.
Mas cheguei ao topo, passando até as nuvens,
Fiquei perto do céu sentindo só a solidão,
Não querendo ficar por lá muito tempo,
Comecei a minha descida de tal montanha..
Falo de viagens que nunca fiz,
E de sítios onde nunca ouvi falar,
Mas na sala onde tudo era branco,
Fui até ao paraíso que parecia ser eterno;
De subir montanhas, suportando o frio,
Enfrentando ventos furiosos de seu ciúme.
Viajei com a alma; viajei com o corpo,
De mãos dadas com outro corpo e alma.
Nada é eterno. Nada é imortal,
Nem o homem nem a Terra cá ficarão para sempre,
Doloroso é assimilar certo destino,
De verdade absoluta, impiedosa Morte.
Sem darmos conta vamos sendo substituídos,
Por meros objectos que furtam nossa cor,
Ou nosso gosto pela decoração mais íntima.
Os sorrisos são retirados das paredes,
Para dar lugar a um quadro qualquer,
Que nem lá tem a nossa assinatura,
Comprado por tuta-e-meia numa qualquer feira.
As palavras são substituídas por um silencio,
Constrangedor para quem muito falava,
E onde estavam os anjos musicais alegres,
Estão uns cortinados que desmaiam nas paredes.
Candeeiros e caixas que vendem sonhos,
Que riem da nossa pura vegetação;
Já só se fala de contas que nos apertam,
O coração que pulsa de ansiedade.
Já não se salta para cima do canapé,
Livremente; está lá um mais arrogante,
Vistoso, luxuriante que escravizou,
Que dá sono, tédio e estúpido conforto.
Está composta assim a sala de agora,
O que vazio foi já hoje não o é,
Está vistosa, majestosa de bom gosto,
Mas caprichosa, sem me dizer palavra.
Pois no vazio é-me fácil preencher,
Com os encantos que em tempos cultivamos,
Não me curvo perante ela, a vaidosa,
Por ter saudade da simplicidade.
Edmond
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