sexta-feira, outubro 15, 2004

Liberdade de pressão

Quem me dera que os meus dias de trabalho fossem assim de vez em quando, não sempre, mas haver dias em que os chefes, esses capatazes dos tempos modernos, estão para fora em reuniões importantes e nos escritórios, fica a raia miúda a trabalhar. Quanto ao meu desempenho de hoje, digo que não podia ser melhor. Estou a ouvir um bom álbum de Iron Maiden, mas esqueci-me de trazer os de Pantera.
Acordei hoje com um sentimento de nostalgia pura. É como ir ao sotão esquálido e abrir um baú de coisas esquecidas, retirar a poeira das coisas e ouvir vozes de um passado alegre, para quem o teve, é claro. E hoje, lembrei-me que dentro de mim ainda existe um sentimento rebelde que me corre nas veias. Mas não e tão explícito.
Ainda tentei escrever um poema sobre a rebeldia, sobre um animal que corre livremente pelo prado que se estende até ao horizonte (palavras assim do género), e lembrei-me de como foi tão bom o meu período da maluqueira. E em grupo era bem melhor. Agora também é bom mas diferente.

Ao ouvir a música que só ouvia no passado, fez-me recordar em que compunha umas boas malhas de barulho na guitarra, conseguindo eriçar os cabelos dos meus pais que me pediam para "por essa merda mais baixo"; dos tempos em que me juntava com a malta que vestia de negro (outros nem por isso, mas não interessava) como um grupo de "Harlequins" ou cavaleiros do Demónio, mas no fundo só queríamos ouvir um som bem fodido, beber umas cervejas e partilhar sentimentos de uma revolta que não sabíamos a sua origem, mas já a sentiamos, e não vinha assim de qualquer lado.
Hoje em dia tenho mais razões para ser rebelde do que nessa altura, pois nesse tempo só tinha os professores a foderem-me a cabeça. Hoje tenho muito mais gente a quem tenho de dar satisfações do meu trabalho, e às vezes da minha vida pessoal para justificar as minhas falhas por não ser um ser perfeito. Não só eu, mas toda essa malta de negra indumentária, que despiu a vestimenta de cavaleiro do demónio e passou a usar fato e gravata de um anjinho. Odeio fato e gravata e todos os que usam, excepto os meus amigos de longa data, sabendo que não trazem sujeira na cabeça e mantem aquela simplicidade de pedir pouco à vida. Às vezes rio-me com escarninho, do 'gang' do fato e gravata que passeiam na hora de almoço. Gosto de observar e ouvir surrateiramente as suas conversas de anjo engomadinho. Digamos que a minha sapiência não sobe de fasquia. Basta olhar para eles para saber logo o que não quero para mim.
Mas sejamos justos. O que às vezes parece não o é, tanto para o lado dos cavaleiros de negro como para os engomados da gravata com cabelo penteado à contabilista de carreira brilhante.

Apetece-me dizer um "FODA-SE!!!" mas não posso, como quando estudava matemática com os meus amigos quase irmãos: "FODA-SE, ESTA MERDA DÁ-ME MAL, CARALHO!!!!, socando a pobre da secretária de madeira. Era o que me apetecía dizer ao meu chefe: "FODA-SE, ESTA RECONCILIAÇÃO DÁ-ME MAL, CARALHO!!!!
Os directores da minha empresa proferem impropérios com uma fluidez da qual me espanta. São todos uns camionistas (não querendo depreciar a casta camionistica) de fato e gravata. Por isso, enganam bem. O sucesso para uma carreira brilhante é ter o cabelo bem aparado, usar um fato caro e passar por despercebido. Mais nada. Engana-se assim muitos ao qual eu não censuro pois cada um sobrevive na selva de betão como pode. O que interessa é chegar ao fim desta vida estúpida que levamos e pensar: FODA-SE: SOBREVIVI A ESTA MERDA TODA!!!! E no fim, já velhinho com a dentadura a escapar-se-me da boca, talvez tenha um sorriso suave e um brilho nos olhos a lembrar a minha vida inteira; talvez as histórias que tenha para contar à irreverente mas necessária juventude, tenha algum interesse e dê motivação para me ajudarem a atravessar a rua. Talvez eles falem do velhote António aos amigos para ouvirem as minhas histórias, do que passei, de quem amei, dos meus pais, amigos, das namoradas que tive, do que escrevi, do que senti, do que odiei, no que acreditei ser melhor para o mundo e para mim. Se me perguntarem o que quero da vida, talvez responda prematuramente que "o que desejo apenas é morrer com um simples sorriso; um sorriso que diga que vivi com alegria, mesmo com as tentativas de lavagem ao cérebro que os meus chefes fazem para esquecer a minha personalidade e substitui-la por um caracter, útil para quem quer subir na vida. O que será subir na vida? Ter um cargo de chefia mas deixar de beber copos com os amigos? Faltar a todos os planos concebidos com gosto da pessoa que se gosta? Repreender? Admoestar? Despedir e arruinar a vida de alguém e sentir essa responsabilidade até ao fim dos meus poucos dias? É ter um carro mais sofisticado? Uma televisão maior? É ficar no escritório na altura do Natal? É dar aumentos a quem me mostra um decote mais ousado quando me pedem para sair mais cedo por ter uma queca combinada com o namorado ou amante, com a desculpa esfarrapadíssima de uma falsa ida ao médico? E eu que pensava que todas estas histórias eram fictícias nos meus tempos de rebelde. Infelizmente, não o são, pois vejo e oiço muito coisa que me repugna com solenidade, e o mais confortável de tudo é acharem que sou ingénuo. Quanto mais chefes conheço mais defensor dos animais me torno, pois dizer que os chefes são uma cambada de animais, não é prejurativo para eles mas sim com os animais, pois com eles temos muita coisa aprender.

Que bom é viver a vida com ingenuidade. Vou voltar a colocar os meus "head-phones" e ouvir outro som fodido!!!!!!!!

Yeah!

Não vou pedir desculpas das ordinarices que escrevo pois considero ser mais ordinário as merdas que eu oiço dos meus chefes.

Adieu, mes amis

Edmond

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