quinta-feira, julho 15, 2004

A Máquina Fiscal

Quem decide pode errar, quem não decide já errou.
(Autor desconhecido)

Vamos recuar um pouco no tempo... (vou tentar simplificar a parte “técnica” da coisa). Enquadramento:

- em Junho de 2002 o IVA passou de 17% para 19% (ok, a malta paga...)
- nessa altura, as Finanças emitiram um Oficio, informando que o imposto se deve na altura da sua ocorrência, i.é, se eu vendi em Maio (iva a 17%) mas tive que emitir uma segunda factura em Agosto (em que o iva em vigor é 19%) essa segunda factura terá uma incidência de iva de 17%, já que o facto que a origina ocorreu em Maio.
- eu percebo isto, é simples. O Fisco também, já que foi quem criou a lei e as regras.

Em Abril de 2003 sou informado pelas Finanças que numa conferência às declarações de iva (do mês de Julho de 2002) da empresa onde trabalho foi detectada uma incoerência e como tal a empresa está em falta com o pagamento de iva no valor de X, que deverá fazer imediatamente. Acontece que em Julho eu liquidei facturas com iva a 19% e com iva a 17% e que a chamada “conferência” feita pelos serviços das Finanças é na verdade uma aplicação da regra de 3 simples... logo se eu tenho base tributável (facturas) no valor A, aplico a taxa de 19 e dá que terei de pagar iva no valor de Y e não X.
Como tal, a minha empresa teria de pagar o iva em falta, mais juros de mora, mais juros compensatório.
Muito calmamente respodemos às Finanças dizendo que não existe erro, que existe liquidação iva a 17%, explicamos tudo muito claramente, juntamos cópias de tudo o que é papel possível e imaginário... e está feito, eles agora lêem o processo e acertam o erro por eles cometido.
Isto é o normal, certo? Eles pensam que nós cometemos um erro, Nós esplicamos que não que o erro é deles, Eles compreendem que por vezes estas coisas de impostos não se resolvem por regras de 3 simples e dizem que não devemos nada. Isto é o normal, certo?
NÃO. Em Portugal não é assim.
Em Junho de 2004 a empresa onde trabalhas recebe uam Liquidação. Digamos que uma Liq. Oficiosa não fica lá muito bem no cadastro fiscal de uma empresa... digamos até que é mesmo muito mau... Mas mesmo uma cena grave!!!
Ok, por esta altura o termo “porreiro” não é o que aparece a seguir a “gajo das finanças”, esses &/%%#/&%$#%$#!!!!

Mas mesmo assim um tipo mantém a calma e vai com uma resma de papéis ao Bairro Fiscal... a chamada “cereja no topo do bolo”.
Depois de passares por duas ou três chafaricas, estás diante do supra-sumo em matéria de iva lá do sítio... o chefe de repartição! Após uma primeira explicação, em que o gajo cagou completamente para o que eu estava para ali a dizer (devia ainda estar com a cabeça no cabeçalho da Bola...), o tipo responde “se há uma liquidação Oficiosa, então existe uma razão para isso”... estilo, estas merdas são sérias e não são feitas por “dá cá aquela palha”.
Após uma segunda exposição de argumentos e documentos, aparece então a resposta esperada... “poís, o senhor tem razão! Não existe divida”... fixe, cool, finalmente, aléluia... pensando eu que estava resolvido... “eu não posso fazer nada, não posso alterar”. Fo#%-$&!!! É então que me explicam que a única medida que posso tomar é fazer uma Reclamação Graciosa (é o nome... graciosa, só podem estar a brincar).
Nenhuma situação é de tal modo grave que não seja susceptível de piorar...
(Frederico II )

Isto é assim, perante o facto de EU ter plena razão, terei que enviar uma Reclamação Graciosa, que é a única reacção a uma liquidação adicional de imposto efectuada pelos serviços da Administração Fiscal pela via administrativa. Os tipos têm seis meses para me responder, ou seja optar pelo seu deferimento ou indeferimento e caso não o façam, decorrido esse período sem pronuncia sobre a mesma, esta presume-se indeferida (indeferimento tácito). Conclusão, estou sempre fod#$&....

Melhor ainda é que caso eu necessite de uma Declaração de inexistência de dívidas fiscais, eles não a passam.
“poís, não lhe pudemos diferir. O senhor tem um processo oficioso pendente... na verdade tem uma divida por pagar” Ah????

Tendo em conta que na grande parte dos grandes projectos que esta empresa se envolve é preciso apresentar essa declaração ao cliente, caso contrário perdemos o negócio, fico impossibilitado de o fazer sem que tenha cometido qualquer iligalidade ou “fuga” fiscal. A única hipotese é se eu proceder ao pagamento de uma quantia que não devo.
“o melhor a fazer é proceder à liquidação e apresentar a reclamação. Depois eles reembolsam-no”

Ou seja, eu não devo nada, eles cometem o erro, sabem disso e não o podem rectificar, eu é que tenho de justificar perante a inepcia deles e no final de tudo isto tenho mesmo de pagar, caso contrário eles não me passam uma declaração imprescindível. Tudo isto porque em DOIS anos a Administração Fiscal ainda não comprendeu que a fiscalidade pode ir além de uma regra de 3 simples...
A doença do ignorante é ignorar a sua próxima ignorância.
(Amos Bronson Alcott)

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