O ócio é um veneno, um inimigo a abater; uma companhia que rejeito e fujo como se faz com o fogo, com medo de nos queimarmo-nos; uma força sobrenatural que toma conta da nossa vontade, escravizando-nos num mundo do vazio e do nada, estupidificando os nossos sentidos, pensamentos e desejos, em que nada serve para passar ou aproveitar bem o tempo, essa riqueza preciosa nos tempos de hoje.
Vim agora do café lembrando-me desses ociosos tempos, por ter reparado que a meu lado, estavam as duas rainhas aqui do trabalho da cavaqueira e do real "corte e costura", como se diz lá na terra do meu pai, em que coaxavam como duas rãs num lamacento pantanal num local de trabalho onde existem os que trabalham para o seu sustento, os que trabalham em função de uma possível carreira mais sorridente e, como não podia deixar de ser, os ociosos.
Os ociosos têm particularidades que os distinguem dos outros: falam baixinho, murmurando palavras que soam a cusquice e maldicência, porque se não o fosse, comportar-se-iam naturalmente. E andam sempre aos pares como os caranguejos, pois que divertimento seria se não tivessem alguém para partilhar as suas mesquinhas reflexões sobre o que lhes é alheio? O efeito não seria o mesmo. São sempre os que contestam as decisões que se toma em função do trabalho, não apresentando qualquer melhor alternativa para o mesmo, preferindo ter a primeira pior das reacções: a contestação. Se repararem bem, têm um olhar encovado, esculpido pelo medo de serem apanhados em flagrante num delito qualquer que os compromete, e assustam-se com relativa facilidade, pois quem se dedica à espionagem, terá de olhar sempre por cima do ombro, e quando não o fazem, assustam-se inúmeras vezes. Nunca olham nos olhos quando falam com alguém. Estão sempre prontos a fugir do local quando um confronto existe por mais saudável que o mesmo confronto seja.
E isto tudo porque são ociosos. Corre-lhes nas veias um profundo pesar nos seus gostos, metas a atingir ou conversas que não as têm porque não conseguem falar do que não seja o seu tema preferido, que é para eles a maldicência. O ócio, aponderando-se deles por completo, teceu-lhes uma teia que lhe encurta os horizontes, não lhes permitindo aceitar o mundo que os rodeia, por serem incapazes de se livrarem dos seus inúteis preconceitos. Preferem saber para onde vão os outros do que saberem para onde querem ir. E se estas palavras são fruto de ser diaramente uma testemunha desses convívios baratos e fúteis, digo-vos que me afasto deles com medo de ser infectado e tornar-me num ocioso. Já lá dizia o meu sábio pai, "diz-me com quem andas, dir-te-ei quem és". Já fui rotulado como o solitário aqui dos campos do labor, e se querem saber, a minha solidão é tão doce que me permite abstrair dessa gente , em que a sua vontade escasseou num momento qualquer nas suas vidas, esquecendo por completo a vigília dos seus pensamentos. Já Napoleão dizia que receava mais o ócio aliada à estupidez, do que o próprio campo de batalha, o que não deixa de ser curioso.
Mas como o chão não é totalmente firme para ninguém, poderei ser derrubado um dia e mergulhar num lago de águas ociosas, o que seria para mim uma hecatombe. Cada vez que esses tempos ociosos me visitam, sou abalrroado com uma vergonha imensa de mim próprio, chorando pelo tempo perdido e desperdiçado em pequenas coisas. O trabalho ajuda nesse sentido. Faz-nos sentir úteis e activos, mesmo fazendo aquilo que não gostamos muito mas que nos mantêm vivos e aproveitados, percorrendo na vida caminhos em que se vê um horizonte mais amplo, envolvendo-nos. É tudo uma questão de opções.
São as palavras escritas em momentos de ócio no trabalho.............
Adieu
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